No dia 16 de junho, a Irlanda comemora o Bloomsday, um dia especialmente dedicado a homenagear o protagonista Leopold Bloom, do livro “Ulysses”, de James Joyce. A obra literária conta a história de um dia na vida de vários personagens em Dublin, no dia 16 de Junho de 1904. Ao longo dos capítulos Joyce descreve muito bem os dilemas e as adversidades de todos os personagens e transforma um dia cotidiano em algo excepcionalmente interessante.
James Joyce é um escritor irlandês e um dos maiores autores do século XX. Joyce se utiliza de diversos estilos narrativos e sua obra é repleta de modernidades, símbolos e referências. O autor é muito conhecido pelo seu uso experimental da linguagem, inventando novas palavras e dando sentido a outras.
O ano de 2022 é muito importante para Irlanda pois neste ano comemoraremos o centenário da publicação do livro “Ulysses”. Para celebrar este importante marco histórico, a Embaixada da Irlanda, em parceria com 18 universidades por todo o Brasil, apresenta o projeto “Ulysses100 Pelos Olhos Brasileiros”, a fim de conceber uma interpretação visual de um dos 18 capítulos do livro. O propósito do projeto é explorar como a juventude brasileira interpreta o livro “Ulysses” 100 anos depois da sua publicação.
A Universidade do Estado do Amazonas foi uma das dezoito universidades brasileiras selecionadas para participar do Projeto “Ulysses 100 pelos Olhos Brasileiros”, para a execução da interpretação artística do episódio 2 (Nestor), a qual pode ser visitada na Escola Normal Superior, nº 2470, em Manaus.
A pintura em muro mede 4 metros de largura e 3 metros de altura (área de 12 metros quadrados) e foi realizada pela artista Rejane Marques, egressa do Curso de Geografia da Escola Normal Superior.
O croqui da ilustração foi feito com a técnica de pintura em aquarela em tamanho de 50x70 e inspirada no episódio 2 do livro (Nestor).
No centro do desenho estão imagens caricaturais do próprio James Joyce, como adulto e como criança, representando Stephen e Sargent, em alusão às notas autobiográficas que aparecem na obra de Joyce. Ambos sentados em volta de uma mesa de estudo numa sala de aula em um reencontro do autor consigo mesmo. A cor desta imagem, da sala e dos personagens, são em preto e branco para dar a ideia de tempo passado e referência ao ambiente do episódio.
A sala de aula representa o papel fundamental da educação como fator de transformação social, fazendo alusão também ao acolhimento do projeto Ulysses 100 por 18 Universidades brasileiras. Outro elemento central é a imagem do cavalo em movimento na cor marrom, simbolizando a passagem implacável do tempo e da história, que são símbolos e referências centrais deste episódio.
Uma frase em particular que me inspirou na montagem dos elementos do mural foi: “Sobre seus sábios ombros por entre o xadrez das folhas o sol lançava lentes, moedas dançantes.”. Baseada nos elementos imagéticos desta frase final do episódio, compus os círculos, como se fossem “moedas dançantes”, onde estão inseridas as figuras e os demais elementos do desenho alusivos à guerra e à paz. E por ela me inspirei a criar uma grande árvore em uma das bordas da ilustração, o elemento da Floresta Amazônica, da qual saem moedas e esferas de luz de suas folhagens.
A guerra e a paz são elementos de inspiração como pontos de escuridão e de luz na passagem da história da Humanidade. São cenas simbolizadas em círculos coloridos. Trago a guerra e o pesadelo humano deste flagelo no mundo. Também ilustrei, através da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a busca pela paz e pela justiça, em homenagem também a Roger Casement, pioneiro na denúncia de violações graves, maciças e sistemáticas dos direitos dos povos indígenas da Amazônia no início do século XX.
Como artista brasileira, lendo Ulysses em 2022, não poderia deixar de retratar personagens como Mário de Andrade e Tarcila do Amaral, relacionando a modernidade de Ulysses com a Semana de Arte Moderna no Brasil, coincidentemente contemporâneas e centenárias.
Outro aspecto que me chamou a atenção foi a discussão trazida pelo autor aquela época sobre o ódio racial e de gênero nas falas do sr. Dease, diretor da escola. Este personagem traz uma fala xenofóbica, anti-semita e misógina, revelada com tom de ironia, pela conversa com o professor Stephen, já caminhando para o final do episódio. Destaco: “a mulher trouxe o pecado ao mundo”. Daí porque me inspirou inserir Tarcila como representação feminina.
A comemoração dos 100 anos desta obra da literatura mundial, juntamente com os 100 anos da Semana de arte Moderna e do bicentenário da Independência do Brasil e centenário do processo de libertação na Irlanda, foram fontes de inspiração para mim, pois a referência central do episódio Nestor é a História. Por isso, fazendo alusão ao entrecruzamento das histórias da Irlanda e do Brasil, criei um símbolo na parte superior direita, para marcar o amor à liberdade de ambos os povos e a cooperação internacional pela Paz.